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Cidade fundada a partir de um seringal de nome Foz do Muru, no início do século XX. Em 1907 passou a ser vila. Anos depois, 24 de Abril de 1913, foi elevada à categoria de cidade. Até 1943 o município se chamou SEABRA, quando então recebeu o nome TARAUACÁ, palavra indígena que quer dizer "rio dos paus ou das tronqueiras". O abacaxi gigante que a região produz, de até 15 kg, juntamente com as inúmeras tarauacaenses que venceram o concurso Miss Acre, Tarauacá ficou conhecida como “Terra da mulher bonita e do abacaxi grande”.

O CORONEL E O "SURUCUCU"

José Higino de Souza Filho 


O fato aconteceu com o dr. José Tomaz da Cunha de Vasconcelos, chegado a Tarauacá em 1916, como prefeito do Departamento, nomeado pelo Presidente da República. Homem enérgico e trabalhador, porém de um autoritarismo adentrando às raias da violência, o novo governante, durante a sua gestão, procurou pôr um freio aos abusos cometidos por alguns coronéis, cuja fama de prática de maus tratos contra seringueiros era de todos conhecidos.

Com tal postura, em pouco tempo, o prefeito conseguiu arregimentar contra ele a maioria dos coronéis locais, que inclusive, lhe deram logo o apelido de “Surucucu”, face a certas atitudes atrabiliárias tomadas contra tais seringalistas. 

Conta-se, por exemplo, que um desses coronéis, habituado que era a pôr seringueiros no tronco e açoitar, certa vez, não satisfeito apenas com essa forma de castigo, obrigou a uma de suas vítimas a correr no campo em volta do barracão, com um chocalho pendurado no pescoço, como se um burro fosse.

Chegando o fato ao conhecimento de tal governante, este, indignado, determinou que tão logo o tal coronel viesse à cidade, o levassem à sua presença, pois que ele o iria obrigá-lo a caminhar, da mesma maneira, pelas ruas do ainda pequeno vilarejo. Ignorando a humilhante ameaça que pairava sobre a sua pessoa, um belo dia o coronel deixa o seu seringal no rio Muru, com destino à sede do município, onde pretendia tratar de negócios e desenfastiar-se do isolamento em que vivia. 

Alertado, porém, por um amigo, a quem quis visitar já bem próximo à cidade, de que o “Surucucu” estava querendo acertar contas com ele, o coronel desceu às pressas o barranco que mal acabara de subir e, retomando, rapidamente, a embarcação, tão fortes e rápidas foram suas remadas rio acima, que jamais, a um transporte daquela espécie, velocidade tamanha fora imprimida contra a corredeira.

Durante o tempo em que o dr. Cunha permaneceu na Prefeitura, o coronel, por precaução, não mais saiu do seringal. 

Verdade é que, na gestão do tão temido prefeito, pessoas importantes foram postas a rolar cumaru-ferro com machado cego, enquanto outras, vestida de fraque e cartola, capinaram ruas da cidade, sem falar das vezes que saíam corridas e se valiam da proteção de algum coronel mais respeitado, como aconteceu, por mais de uma vez, com o jornalista Pedro Leite, dono do jornal “O Município”.

O clima contra o prefeito, no entanto, ficava cada vez mais tenso e, um certo dia, uma bomba havia explodido, debaixo da sua residência, ferindo gravemente sua esposa. Um modesto comerciante de nome Amin Kontar, tendo sido preso como suspeito por um delegado que já era seu inimigo, foi torturado até a morte na prisão, sendo que, só muitos anos mais tarde, veio se saber quem foram os verdadeiros autores da façanha. 

Quando, chamado, tempos depois, ao Rio de Janeiro, pelo Ministro da Justiça, em virtude de seguidas denúncias à sua pessoa, deveria substituí-lo na Prefeitura, na qualidade de primeiro suplente, o seu genro dr. Rafael Guedes Correa Godim, cuja posse, todavia, não aconteceu, impedida foi por um levante armado liderado pelo cel. Júlio Pereira Roque, o segundo suplente, sendo intenção ainda do movimento, colocar o impedido numa canoa, rio abaixo, coisa que só não chegou a se concretizar, graças ao prestígio e coragem do coronel e seringalista Joaquim Pinheiro Cavalcante, que o tomou sob sua proteção, levando-o para sua residência, na chácara “Corcovado”, onde o mesmo permaneceu até o dia em que, desanimado, deixou de vez o município. Por ironia do destino, tempos depois deu-se a sua volta à Tarauacá, dessa feita como juiz de Direito do lugar. Educado como era, nunca demonstrou, contudo, qualquer interesse de vingança contra os seus inimigos. O dr. Cunha, por sua vez, anos depois (1930), voltou ao Acre, como governador do Território, já na vigência da nova organização administrativa, adotada a partir de 1920, elegendo-se, em 1934, deputado federal pela Chapa Popular.


FILHO, José Higino de Sousa. A luta contra os astros. Recife: Núcleo de Apoio Técnico Administrativo do Departamento Nacional do SENAI, 1994. 




JOSÉ HIGINO DE SOUZA FILHO era tarauacaense, e faleceu em Rio Branco-AC, em outubro de 2010. Membro da Academia Acreana de Letras, escreveu os seguintes livros: SENAI – 10 anos contribuindo para o desenvolvimento do Acre; O trabalho vence tudo (1993); A Luta Contra os Astros (1994); e Segundo Hound (2009).

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